quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

A Visita Cruel do Tempo

de Jennifer Egan

por Maria Albeti Vitoriano

O livro A Visita Cruel do Tempo narra várias estórias, ambientadas em São Francisco, Nápoles, em um safári na África, em um país não identificado e em Nova Iorque, num período de aproximadamente 28 anos (antes de 1980 até após a queda das torres gêmeas).
O núcleo central das estórias gira em torno de um grupo de jovens de São Francisco, Bennie Salazar, Scotty, Alice, Jocelyn e Rhea, que viviam envolvidos com música (rock) e drogas, e diversos outros que estão de alguma forma associados a eles, tais como Lou, Sasha, La Doll, Lulu, Stephanie e Jules.
As estórias, normalmente, estão contidas em um capítulo, mostram no conjunto do livro a diferença entre A (o passado)  e B (o presente). Os contos são permeados pela   nostalgia, lembranças do passado, dos amigos que estão distantes ou morrendo. Mostra, no presente, a vida confortável que Bennie conseguiu e de  outro lado,  o submundo em que vive Scotty, quase que num lixão e o leito de hospital de Lou, na sua  própria casa..
Destaca comportamentos moldados pela necessidade de fazer sucesso ou se sentir aceito, como é o caso de Bennie, que vive a angústia em relação à diferença da música que ele gosta e a que ele vende, bem como a convivência forçada com republicanos..
Como o próprio nome do livro insinua a autora parece ter o objetivo de mostrar a ação do tempo sobre as pessoas, suas angústias e o fim dos relacionamentos. Mostra a chegada da velhice e da doença, como é o caso de Lou, cujo filho acabou cometendo suicídio.
Interessante perceber que não existe praticamente nenhum relacionamento estável, talvez somente o de Bennie Salazar com a sua assistente Sasha, a cleptomaníaca que no final  parece ter sido substituída por Lulu.
Alguns têm sucesso, como Bennie, outros não, como é o caso de Scotty. Lou era um bon vivant, teve muitas mulheres e vários filhos, mas no final da vida estava só, acompanhando somente por um enfermeiro.
Na verdade, são várias estórias em paralelo, onde os personagens se cruzam diretamente ou por meio de parentes (irmãos, filhos, cunhados), mas poucas são finalizadas. Fica a dúvida, Sasha se curou da cleptomania, Lou viveu quanto tempo.
O livro é monótono, principalmente no safári da África, um dos momentos mais cansativos do livros, mas é interessante alguns artifícios usados pela autora, como, por exemplo, no Capítulo 3, onde se demora a descobrir  quem está contando a estória – que é Rhea – e no Capítulo 10, onde há uso da 2ª. pessoa, como um personagem que permanece oculto.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

O Centésimo em Roma

de Max Malmann



por Ana Studart


O CENTÉSIMO EM ROMA é um romance de Max Malmann, escritor premiado e conhecido roteirista de “A Grande Família”, que alia história, ficção e suspense policial.

O livro relata, fundamentado em extensa pesquisa da Roma Antiga, a saga do valente centurião Desiderius Dolens, que, nascido em berço pobre, na Suburra, sonha um dia ser cavaleiro, por mérito ou por compra do título.
Esse personagem mistura brutalidade e doçura, coragem e medo, hipocondria, ironia, sarcasmo, rabugice e bom humor, além de uma quase total ausência de escrúpulos – digo quase, porque o episódio da distribuição com sua tropa do dinheiro surrupiado dos cristãos o redimiu um pouco dessa falha de caráter. Apesar de tudo, ao fim do livro vi Desiderius Dolens como um verdadeiro (anti)herói.


PDV:

O narrador é Nepos, suboficial assistente (optio) de Dolens. Descende da nobre família Trebélia, mas renuncia a tudo para se tornar legionário e ser admirado por seus próprios méritos. A narração acontece de duas formas: na terceira pessoa onisciente, quando Nepos relata o presente, e na primeira pessoa, quando Nepos descreve o que acontecera anos atrás. São colocados em capítulos separados e diferenciados por tipos de letra de tamanhos diferentes.


O Título

Para o título, Malmann se inspirou na frase de Julio César, escrita por Plutarco “prefiro ser primeiro numa aldeia do que o segundo em Roma” e outra de Machado de Assis, cujo personagem do conto “Um Homem Celebre” diz se satisfazer em ser o “o centésimo em Roma”. Dolens se satisfaz com o título de cavaleiro.


A Estrutura

O romance está dividido em cinco livros, que se subdividem em capítulos, de modo geral bem curtos, o que dá dinamismo `a leitura.
Achei interessante a diagramação dos dois textos, o atual e o passado: a ficção com tipo maior, e os “documentos históricos” com tipo menor, com trechos do Vita Dolentis de Trebellius Nepos. Até agora estou sem saber em que medida esses documentos são fieis a um texto original.
(O próprio Max Malmann, em entrevista de 24 de julho de 2010 compilada em seu blog, diz que o sebo Nova Roma existe, a Roma do século I existiu, e o carcomido exemplar da Vita Dolentis é tão tangível quanto os bytes que digita...)
De qualquer forma, creio que o autor não pretendeu relatar uma obra histórica fiel, e sim uma visita à Roma antiga com o olhar do século XXI- é quando identificamos no livro a miséria, o suborno, a ambição, a traição, a injustiça, a adulação, o autoritarismo e a corrupção existentes nos nossos dias – e em todos os tempos. Há espaço também para o homossexualismo, bissexualiamo, e uso de drogas- o cânhamo.E tudo foi proposital, como confirma o autor:

“Quis apenas sugerir que a História da Humanidade, alem de cíclica, é ciclotímica”

Quanto ao paralelo entre as potências Império Romano e os Estados Unidos, Max Malmann sugere um talvez, dizendo que nunca quis fazer uma comparação direta entre as guerras santas dos romanos contra cristãos e dos norte americanos contra extremistas do Islã.

O Enredo

O Centésimo em Roma conta a história do período entre 68 e 70 d.C, tempo da guerra civil conhecida como O Ano dos Quatro Imperadores, em que Roma teve uma sucessão de Césares, todos golpistas e emocionalmente desequilibrados, a começar por Nero e seu fascínio pelo fogo, passando pela figura estropiada de Galba, por Otho com suas perucas, e terminando com Vitellius. (Ao fim do livro o autor diz que os retratou de acordo com descrições feitas por Tácito, Suetonio, Plutarco. Parece que eram assim mesmo! )
O livro é recheado de amores, assassinatos e crenças religiosas, formando várias histórias sem que nenhuma seja central. Mesmo o assassinato do senador Trebellius Longinus poderia não existir no livro, sem qualquer prejuízo. O centro do romance é mesmo Desiderius Dolens, que passeia por esses cenários de turbulência política na Urbe de Roma, servindo à autoridade do momento que melhor lhe convém.
A história é boa e bem desenvolvida.
Duas reviravoltas surpreendem o leitor: o Episcopus, o procurado e perseguido Papa cristão, é o pai de Dolens que ele acreditava morto e por quem se endividou para fazer o funeral.
Surpresa final: Dolens, depois de tentar por todos os meios a sua ascenção social, por um acaso fortuito foi nomeado tribuno comandante pelo imperador Otho, (que sempre troca o nome de Dolens por Valens), o que o eleva à condição tão sonhada de cavaleiro.

Os Personagens:

Como sou grande admiradora dos romances de ficção histórica escritos por Marguerite Yourcenar, “Memórias de Adriano”, e “A Obra em Negro”, a princípio estranhei a forma divertida de apresentar diálogos e situações de Max Malmann.
Mas pouco a pouco fui me afeiçoando a Dolens, o carniceiro de Bonna, com sua visão por vezes romântica, por vezes ácida da vida; de Marusia, a germânica que virou uma romana “albina”e tinha o “nome impronunciável”de Galswinth; dos desvelos da mãe, Moderata; do baixinho Nepos, manquitolando com sua bengala, um aristocrata culto que fala grego e renunciou a seus privilégios para se tornar legionário e a quem Dolens castiga sempre com a humilhação de limpar as latrinas da Casta Pretoria, por um prazo que pode ir até as calendas gregas - tarefa que ele cumpre sempre com “estoicismo”; do centurião Julius Atticus, com suas pupilas tortas; e do legionário burrinho Murcus, estendendo o braço na saudação dos romanos, em “Ave!” e irritando Dolens: “Sempre que você me saúda como se eu fosse um nobre, sinto vontade de decepar o seu braço”; do jovem tribuno Domiciano, sobrinho do senador Nerva, protetor de Dolens, que tem por hobby caçar e mutilar moscas, e que mais tarde se torna o imperador César Domiciano Augustos.

Os imperadores recebem qualificativos marcantes: Nero, o “desbrioso”, qualificado como “matricida”, “glutão e tolo” que assassinava a “arte com sua cítara; Sulspicius Galba, um homem “idoso”, “viúvo” e “avarento, que foi imperador “sem pertencer à família dos cesares”, como observa Murcus, evidenciando o pragmatismo de Dolens: “Se ele ordenar que o saudemos como Galba César, nós o saudaremos como Galba César”; Marcus Salvius Otho, salvo do suicídio por Dolens , franzino, baixinho, de saltos, beirando o ridículo, escolhia seus escravos pelos cabelos, para transforma-los em perucas que escondiam sua calvície e lhe caíam da cabeça. Amigo de Nero, casou-se com sua paixão, Popeia, para dá-la a Nero como amante. Em Otho viviam dois homens: “um faminto de glória, outro destinado ao fracasso”..
Vale comentar o brinquedo de Domiciano, um anão indonésio chamado Turpis ( feio), que também dá tempero ao humor do livro.
O romance tem uma infinidade de personagens com nomes que acreditei serem colhidos da antiguidade, para ao fim descobrir, por exemplo, que o sobrenome do (anti)-herói Dolens teve por inspiração o Doyle do autor de Sherlock Holmes, o som das palavras dólmã (roupa militar) dólmen ( titulo megalítico), e golem, do folclore judaico e, para meu espanto, até o nome de Mickey Dolenz, da banda The Monkees!
E Desiderius, claro, vem do desejo....
Foi de grande sabedoria o autor colocar um dicionário de nomes ao final do livro, para que pudéssemos relembrar os personagens ( eu sempre confundia Vitellius com Vespasianus, por exemplo...)
Em resumo, os personagens principais foram bem estruturados e me pareceram todos bem verossímeis.

A Ambientação

O Centésimo em Roma retrata o povo romano e agregados, incluindo césares, senadores, cavaleiros, legionários, centuriões, prostitutas, vestais, punguistas, agiotas, curandeiras, homossexuais e uma grande horda de miseráveis, com suas habitações e palácios.
Estão nele as vielas de lama, os quartéis, o espaço de torturas ( conveniente chamado de Domus Doloris), o Fórum; o Múnus Vestae, a taverna sórdida da Suburra; a suntuosidade extravagante do Domus Aurea, palácio construído por Nero “às custas do Tesouro Público”.
Nessa Roma convivem “germanas tatuadas, asiáticas de pele amarela, egípcias acobreadas, númidas cor da noite, iberos hirsutos, gregos depilados, capadócios de longos bigodes”, etíopes, germanos, judeus, cristãos, aristocratas, plebeus, legionários; vestidos em túnicas de seda, linho ou lã, guerreiros em cotas de malha feitas de anéis de ferro, com elmos, cinturões e botas com cravos na sola.
Embora o autor não se detenha em descrições minuciosas de cenários, o livro nos passa uma imagem bem convincente de como seria viver na Roma no século I d.C. Era como se eu acompanhasse Dolens em seus caminhos pelas vias da Roma antiga. Quase senti aquele cheiro de “molho de peixe, suor e esgoto” da cidade, que Dolens tanto curtia.

Peculiaridades

O próprio Max Malmann relata suas singularidades ao final do romance, lembrando aqueles making of que vem junto com os DVDs.
Ilíada de Homero, Eneida de Virgílio, Édipo Rei, Evangelho, discurso do inglês Chamberlain, Churchill, citações de Shakespeare, Machado de Assis, todos de alguma forma foram inseridos no livro, como confessa o autor. Reconheci com prazer no capitulo XLII do livro Quinto semelhanças com O Incrível Exército de Branca Leone, um dos meus filmes prediletos.
A denominação das cidades é similar à atual: Bonna é a alemã Bonn, e daí por diante.
Descobrimos que a tabula é jogo antecessor ao gamão!
E o “toque”de Max, de sempre iniciar um parágrafo com letra diferente do anterior.
Também construiu versos em dodecassílabos, pelo prazer de faze-los. E assim por diante.

Conclusão

Demorei algumas várias páginas para me adaptar ao ritmo do livro, que me pareceu lento, no começo. Comecei a curtir mesmo a partir do Segundo Livro. Estranhei também, como já disse, o vocabulário com expressões e palavrões atuais.
Os textos em grego eram dispensáveis ou, no mínimo, pediam uma tradução.
O que dá leveza à leitura são os diálogos, muito bem colocados, em geral com humor.
Saboreei especialmente o capítulo XXVIII do Líber Tertius, onde se discutem dogmas cristãos- como o Pai, o Filho e o Espírito Santo formam um único Deus, quando o entendimento era de que deveriam ser três, e seriam equivalentes a Júpiter, Apolo e Mercúrio?
Ou o comentário de Dolens ao saber por Anacletus que não havia orgias nos cultos cristãos:”É incrível que uma religião tão desprovida de atrativos conquiste tantos adeptos”.... E ainda: ”esse deus supostamente único é o pai que deixa o filho morrer na cruz, é o filho que voltou dos mortos, ou é o fantasma voador?”... “você não poderia ter escolhido uma religião menos confusa?
Salta aos olhos o paralelo (jocoso, acredito) feito entre o comunismo e o cristianismo, quando Dolens diz que os cristãos comem criancinhas...
Exemplo de humor: Qual a diferença entre nós e os bárbaros? pergunta Nepos, depois de uma carnificina. Resposta de Dolens: nós fazemos a barba.
Ou a incrível história do boi subversivo que falava mal do imperador, capturado por Dolens e torturado em interrogatório.
A impressão que me fica é que Max Malmann, a despeito do extenso trabalho de pesquisa, se divertiu muito ao escrever esse livro - e eu também me diverti lendo o romance dele.
Há a possibilidade de que o estilo irreverente de seu texto acabe desmerecendo a pesquisa minuciosa que o livro apresenta, mas esse é uma questão para o autor.
Recomendo a leitura, com certeza. O livro é muito bom.

***

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O Centésimo em Roma


de Max Mallmann

por Beth Eloy

Deve ser muito difícil escrever um romance histórico pelo que demanda de pesquisa minuciosa para reproduzir o modo de vida de uma época remota e muito distante. Penso exatamente assim quando vejo um belo filme de época. Foi com base em sólida pesquisa, ratificada pelo autor nas Notas Diversas (páginas 399 a 416) que Max Mallman recria com fina ironia a Cidade Eterna entre os anos 68 a 70 d.C: romanos nobres, plebeus, cristãos, judeus, gregos e germanos convivem nessa vastidão que foi o Império Romano, sua intricada geografia e seu modelo político e social, onde se misturavam corrupção, assassinatos, luxúria e muito sangue.

Tornar a história autônoma, fazer com que ela pulse vivacidade pelos personagens, suas ações e a atmosfera que os envolve é o grande desafio de um romance como esse, e de forma muito humilde, o autor, cita, o medo que teve de fracassar e de que as pessoas não gostassem de ler o livro. Ledo engano: o livro é uma bela obra, prazerosa de ser lida, admirada e que nos leva a reflexão sobre nós, nosso modelo de vida, nossa estrurtura social
Lendo a parte final do livro, na qual o autor descreve os modos e os métodos de que se utilizou para a pesquisa histórica de seu romance, não duvidei da forca de vontade e paciência que foram dedicados nesses quatro anos de trabalho.

O protagonista:

Desiderius Dolens, protagonista da história é um atrapalhado centurião que sonha galgar alguns degraus na hierarquia social romana. Para tanto, trabalhou duro como soldado visando promoções e o cargo de cavaleiro da guarda real. De volta de uma campanha da Germânia recebe a alcunha de “Carniceiro de Bonna” - rumores de que havia chacinado uma cidade repleta de crianças, mulheres e idosos sem piedade.
Ao invés disso, ele é designado para comandar uma das coortes urbanas (um tipo de guarda urbana) fatia mais baixa e decadente dos postos militares.

A história:

O assassinato de um senador incumbe Dolens de investigar o fato e daí surgem personagens, suspeitos pelo crime, que podem ajudá-lo ou atrapalhá-lo em sua tão sonhada ascensão.

O centurião não está interessado em resolver o mistério, mesmo com as insistentes investidas de Nepos, filho do senador assassinado e braço direito de Dolens.

Dolens, é um típico exemplo de “macho”, mas em casa é comandado por Galswinth, Moderata, Desidéria, Olímpia e Eutrópia – hilário modelo de relação familiar.

Os personagens são construídos ao longo dos capítulos e aí nos são apresentados imperadores, escravos, cachorros mancos, pigmeus e cristãos com extremo bom humor. Espaço reservo, para o reencontro de Dólens com o seu pai, já na figura de Episcopus.

Dólens é o personagem principal, mas não menos importante o pobre Nepos, sempre levado a limpar latrinas; Eutrópia e suas viagens a base de cânhamo; Galswinth com sua indolência conveniente; Moderata, a mãe centralizadora; Desidéria a irmã dependente e a escrava Olímpia.


A estrutura do livro também é interessante: a mistura de dois tipos de texto, sendo o primeiro sobre os diálogos e descrições sobre o que acontece na hora em que a história é contada; e o segundo, com um estilo mais formal e histórico, conta a história de Desiderius Dólens, sob a perspectiva de Nepos. O primeiro, sempre forte na forma bem humorada como a história foi contada. O segundo, pareceu-me a própria história.

Demorei um pouco para me habituar ao estilo da leitura, mas foi questão de tempo até que me adaptasse a ela.

Encantamento, ao reler, após citação do autor, textos de clássicos, descritos ao longo de alguns capítulos do Liber Primus até o Liber Quintus. Desculpem os mais versados, fiquei emocionada com a estrutura desses textos.

Finalizo recomendando o livro e agradecendo ao Oswaldo Parente por essa ótima indicação


terça-feira, 9 de outubro de 2012

SERENA

de Ian McEwan
Companhia das Letras, 2012


Por Maria Virginia de Vasconcellos em Outubro de 2012

A história se passa no início dos anos 70, numa Inglaterra em crise, com greves e atentados do IRA, numa Londres bagunçada, com ruas imundas e racionamento de energia.

É contada pela personagem principal, na primeira pessoa do singular, pela jovem Serena, que relata nos primeiros capítulos o início de sua vida, sua infância como filha de um religioso, até  ingressar no MI5-Serviço de Segurança Doméstica Britânico, sob a influência de um namorado maduro.
A narrativa prossegue com Serena recebendo a tarefa do MI5 de cooptar e financiar um escritor – sem que ele tome conhecimento – oferecendo generosos subsídios de uma fundação cultural que é uma mera farsa. A intenção é usar intelectuais  europeus na divulgação de idéias anticomunistas, prática do serviço secreto.
É fácil prever que Serena vai se apaixonar pelo simpático escritor e que esse segredo vai dificultar e envenenar a relação amorosa que surge entre os dois. O difícil é imaginar o que vem depois e o final surpreendente e sofisticado dessa obra.

Na sua maturidade, aos 64 anos, o Ian McEwan parece ter consciência de onde quer levar o leitor. Cada frase faz sentido e a estrutura do texto é lógica e coerente. Embora ele misture duas palestras enormes e entediantes realizadas no MI5, que ameaçam estragar a narrativa, não conseguem, porque ao fim das palestras ele nos surpreende ou com uma Shirley Shilling soltando um palavrão ou com uma reviravolta no contexto.
Ele também insere vários contos do escritor Haley – ocupando de 5 a 10 páginas cada um -  mostrando ter uma imaginação fértil na caracterização de personagens paralelos que, afinal, no último capítulo vão ser utilizados e integrados na história principal de forma ardilosa e brilhante. Portanto, apesar desses contornos ou desvios, o McEwan não perde a linha mestra da narrativa até chegar ao seu apogeu ao final do livro.  

Para quem já leu – Reparação (Atonement) – sua publicação mais conhecida - ou assistiu ao filme Desejo e Reparação – que é baseado nesta ficção, sabe que McEwan é capaz de viradas inspiradoras que envolvem e aliviam o leitor. Aliás, ele é fiel ao leitor. Utilizando suas palavras em Serena (pag. 234 dessa edição), parece haver “um contrato tácito com o leitor, que o escritor deve honrar. Nenhum elemento de um mundo imaginário e nenhum de seus personagens deveria poder se dissolver por causa de um capricho do autor. O inventado tem de ser tão sólido e consistente quanto o real.”

E o real é muito sólido neste livro. A ficção tem como entorno fatos reais.
O contexto da cultura do segredo - vivenciado pela Serena– em contraposição à cultura da transparência -  é assunto em voga na atualidade, ainda que apareça com a marca muito mais forte da ideologia antiterrorista do que anticomunista. O MI5 (Military Intelligence, Section 5) é um serviço britânico que existe até hoje e marcou seu centenário em 2009, embora tenha adquirido nomes diferentes no decorrer do século passado. Portanto, os burocratas  Serenas e Greatorex continuam existindo na atualidade.
Pela Wikipédia, sabe-se que a informação mantida pelo MI5 está imune à publicação e abertura (pela Seção 23 da Lei Freedom of Information Act/2000). No ano de 2006, houve acusações de que o MI5 estaria guardando 272.000 arquivos secretos individuais – equivalente a um em 160 adultos de UK –  sendo que algumas dessas fichas sigilosas, dizem respeito a cidadãos que não ameaçam o país, na visão de alguns políticos. [1]

Enquanto isso, é curioso lembrar que o mundo tem caminhado em direção oposta, para o lado da cultura da transparência: existem hoje 96 países com legislação garantindo o acesso à informação controlada pelos governos (dado de julho de 2012). Nos últimos cinco anos do século XX, formou-se uma onda de legislação de transparência, com 40 países seguindo o exemplo dos pioneiros Finlândia, Estados Unidos e Dinamarca.  O Brasil introduziu, recentemente, em novembro de 2011, uma lei vigorosa (LAI no. 12.527, de 18/11/12) e passou a pertencer a esse grupo da busca da transparência. Numa comparação internacional, o sistema brasileiro de acesso à informação situa-se numa posição mediana, dois graus abaixo de United Kingdom. (Global Right to Information Rating: rti-rating.org).

Voltando ao autor McEwan, segundo a resenha do Serena publicada na revista Veja[2], ele afirma que ”Todos os romances são de espionagem”. Ele expande o sentido do termo espionagem acrescentando: ”Romances investigam o que deixamos em segredo, o que resguardamos na intimidade. Em qualquer relacionamento, há coisas que escondemos, que não dizemos diretamente. Estamos todos envolvidos no controle de informação”.  E, há 20 anos, Ewan publicou um romance estritamente sobre espionagem – O Inocente – ambientado na Berlim dividida da Guerra Fria. Em Serena ele está, portanto, retomando o tema. Na verdade, no sentido amplo, parece que a investigação sempre está presente em seus romances.

Vale a pena estender ainda mais o sentido do termo investigação para abarcar a pesquisa da história real que o autor realiza para compor seus personagens. Quando McEwan coloca na boca do Pierre, o agente da CIA lotado em Londres, que vai ao MI5 fazer uma palestra sobre a guerra fria - a guerra das idéias como dizia, a descrição do evento da Conferência Cultural e Científica pela Paz Mundial (que nome singelo!) ele evoca um fato real. Dedica três páginas a descrever o episódio de confronto entre intelectuais, acadêmicos, escritores, músicos em torno das ideologias e, em especial, a atuação do compositor soviético Chostakóvitch, não dissidente: segundo McEwan, todo o ambiente foi financiado pelas agências  de ambos as lados.

Esse mesmo episódio, ocorrido no Waldorf Astoria, em Nova York, é esmiuçado pelo escritor Alex Ross,  no capítulo Admirável Mundo Novo: a guerra fria e a vanguarda dos anos 50 num livro[3] que trata da história da música contemporâneo-erudita no século XX e de suas relações com o mundo ao redor.
Os dois autores divergem em alguns detalhes, por ex. o Ross indica a data do acontecimento em março de 49, enquanto o McEwan o localiza nos anos cinquenta. Contudo, ambos destacam a participação dos intelectuais de diferentes correntes, “Artistas americanos de esquerda de todas as tendências e disciplinas se reuniram no Waldorf para saudar suas contrapartes soviéticas”. Segundo Ross, “A maioria dos que compareceram não sabia até que ponto o evento havia sido arquitetado pelos propagandistas soviéticos”. 
Enfim, a midia da época teria publicado interpretações diversas sobre “uma das primeiras grandes batalhas de propaganda da Guerra Fria cultural” e, em especial, sobre o discurso de Chostakóvitch, orientado/ordenado pelo Kremlin a criticar compositores dissidentes (em especial Stravinski e Schoenberg) como modernistas reacionários.
O fato é que McEwan utilizou um episódio real para caracterizar o seu personagem da CIA que, por sua vez, discursava para influenciar a amestrada burocrata Serena, figura principal da sua ficção. E apesar desse volteio, o autor se mantém na trama sem perder o fio condutor.

Por último, este livro abre a porta para reflexões de cunho pessoal, sobre opções de vida, sobre influências recebidas, sobre erros e acertos nas escolhas profissionais e sobre as sombras ideológicas que perseguem as idéias e a sociedade. Por tudo isso, recomendo o livro principalmente para os que gostam de romances que têm sustentação em acontecimentos verdadeiros, que misturam ficção à realidade.




[1] De acordo com a Open Society Justice Initiative o debate continua – nota de Out 2011.

[2] A burocracia do segredo, Revista Veja, 4 de julho de 2012
[3] Escutando o século XX – O resto é ruído, Ross, Alex, Companhia das Letras, 2009.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

COMER, REZAR, AMAR

de Elizabeth Gilbert
Editora Objetiva, 2006


Por  Virginia de Vasconcellos
Brasília, junho/julho de 2008

Elizabeth Gilbert, no seu livro COMER, REZAR, AMAR expõe sua mente suficientemente divertida para compor frases como “mosquito tão grande que pode currar uma vaca”, “praticar masturbação pensando na Mônica x Clinton”.
E, sem escorregar muito, consegue arrancar elogios até da Hillary Clinton. Também, diante dessa, o que poderia comentar a Sra. Clinton a não ser “Adorei Comer, Rezar, Amar”?

O fato é que o livro apresenta uma fusão de culturas ocidente x oriente, incorporando a Itália, a Índia e Bali, desde uma perspectiva atraente, ainda que definitivamente “americanizada”.  Pois, convenhamos,  aquele que  vivencia somente a cultura desenvolvida dificilmente vai “sacar” um “Xamã Balinês” na sua inteireza; menos ainda vai perceber o que significa e como atua um brasileiro sedutor; ou mesmo perceber uma tramóia de balinesa para tirar dinheiro de americana. Na história, foi o brasileiro que percebeu tudo isso rapidamente...

A ingenuidade da visão do americano é mostrada com honestidade. Aliás, o livro cativa por ser honesto. Apesar de persistir uma americana deslumbrada, a E. Gilbert tem uma mentalidade muito aberta e,  repito, uma cabeça muito divertida.

A experiência no ASRAM indiano é descrita com sinceridade e, embora longa, atrai pelo senso de humor constante da autora.

Também é valiosa a pesquisa cultural, tanto gastronômica, quanto mística e histórica, ainda que a obra não tenha pretensão de estudo sócio-antropológico.  Por exemplo, é curioso descobrir que em Bali, os filhos são chamados não pelo nome, mas pela ordem de chegada: UM, DOIS, TRÊS... e por aí vai.

Por último, e não menos importante, trata com critério as “perdas” impostas às pessoas no decorrer da vida. Esse parecer ser o leit motiv que orienta o personagem central. O livro explora as possibilidades terapêuticas, ocidentais e orientais, sem conceitos ou teorias, descrevendo a diversidade de valores, os vários métodos de superação do ser humano, até culminar no ressuscitar, numa nova paixão, utilizando a própria existência como motor de busca da alegria.

Enfim, o livro entretém, informa e educa. Vale a pena ser lido.




sexta-feira, 14 de setembro de 2012

ON THE ROAD


A Última Prise - Uma olhada em "Na Estrada" 
de Jack Kerouac

por Oswaldo Pullen

Prise – 1. Posição das engrenagens da caixa de mudança na qual o motor transmite maior velocidade às rodas. 2. Pitada ou dose de cocaína ou de outro entorpecente. (adaptado do Aurélio)

A edição de Na Estrada examinada é a da LP&M de 2005, da série Pocket, com Introdução e Posfácio de Eduardo Bueno.

Os anos de estrada de Kerouac terminaram desembocando nesta obra que talvez não tenha sido a melhor, mas permaneceu como a sua mais conhecida e emblemática. Na Estrada é marcante, porque conta a história de parcela da juventude que se recusou a participar do sonho americano do pós-guerra. Em vez de hipotecar uma casa, arranjar trabalho fixo e chumbar os pés em algum canto pacato, Sal, Dean e seus amigos entenderam que a melhor vida era a do compromisso algum, a do dia a dia, das festas, das drogas e das estradas.
O desejo irreprimível de ir para algum lugar fez com que Sal Paradise repetidamente abandonasse qualquer projeto, como o de cursar universidade ou se casar. Completamente obcecado por Dean Moriarty, era capaz de atravessar a América de costa a costa, para, às vezes, não ficar mais do que sessenta horas na cidade de destino.
A sua visão de seus amigos vivendo dentro “de um único e imenso quintal, fazendo alguma coisa frenética, correndo de um lado para o outro”, transfere a imagem dupla da eufórica viagem de e para lugar nenhum, de um lado, assim como, de outro, a imaturidade e a falta de sentido da atitude absolutamente caótica de todos eles.
O livro é a celebração de uma atitude existencialista desconectada das posições políticas que lhe seria equivalentes, como as de Jean Paul Sartre e sua filosofia.
E nesta celebração não é levantada sequer a própria atitude filosófica, já que os protagonistas, e principalmente Dean, só se preocupam em ser, ser e ser, sendo clara a sua decomposição e desleixo por seu bem estar ou futuro, ao longo de toda a narrativa.
Vejo Kerouac como um sucessor, mesmo que ele não tivesse a menor ideia disto, de Henry Miller, que em 1934 já havia lançado Trópico de Câncer nos EUA, e que tinha características semelhantes em sua obra, como um texto que mistura ficção com autobiografia, escrevendo no estilo comumente conhecido como fluxo de consciência, e com forte crítica social.
Kerouac, no entanto, se mantém mais comportado, no que tange aos aspectos tanto obscenos quanto surrealistas que Henry Miller gostava de trazer para a sua literatura.
Kerouac também permaneceu dentro do cotidiano norte-americano, coisa que não aconteceu com Miller que trouxe a Paris dos anos vinte e trinta para a sua ficção. No entanto é importante afirmar, como registra a Wikipedia.org, que assim como Kerouac, Miller escreveu combinando autobiografia e ficção, com alguns capítulos seguindo uma estrutura de narrativa de alguma espécie e se referindo a amigos reais, colegas e lugares de trabalho; outros são escritos como reflexões em fluxo-de-consciência que ocasionalmente podem ocorrer como epifâncias. O livro é escrito em primeira pessoa (...).
No que tange a critérios de qualidade literária, algumas vezes Kerouac deixa a desejar, principalmente quando se utiliza de adjetivação dupla ou de imagens que primam por sua singeleza, chegando às raias do piegas.
No entanto, na maioria e na essência de sua obra Kerouac é genial, com suas descrições tal como a que faz (na página 243) de um solo de jazz em um saloon vagabundo na rua Folson.
O livro segue em seu crescente até que Sal, Dean e Stan viajam para o México no Ford 37 que Dean comprara. A mistura de decadência, pobreza e inocência que encontram os levam a pensar que (página 334)
“Atrás de nós se derramava a América inteira, e tudo aquilo que Dean e eu sabíamos sobre a vida, e sobre a vida na estrada. Finalmente havíamos descoberto a terra mágica que ficava no final da estrada e ainda não conseguíamos sequer imaginar as dimensões dessa magia.”
Julgo que o espírito de Na Estrada é resumido em seu início (página 45), com o diálogo:
“A gente está indo para Los Angeles”, berraram.
“O que é que vocês vão fazer lá?”
“Porra, a gente não tem a menor idéia. Que diferença faz?”
Para terminar, digo que Kerouac, apesar das farras, das drogas, da apologia ao vagabundo, trás um olhar despido e inocente da realidade dos anos quarenta e cinquenta nos EUA.  Eu recomendo o livro.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

On the Road

de Jack Kerouack

por Beth Eloy

Me deu prazer e curiosidade de ler o livro "On the Road". Ao longo da leitura fui remetida a cultura americana num tempo espaço onde o escritor se inspirou para escrever o livro e registrar a sua louca aventura de viver e de transgredir num contexto social que levava a necessidade de liberdade e de contestação ao modelo sociual imposto pela sociedade americana.
Ao desejar registrar sua experiência de atravessar os EUA com loucos amigos, ele está cercado pelo tempo e espaço em que vive e busca vivenciar experiências autênticas, um compromisso selvagem, irrresponsável para alguns, mas espontâneo com a vida e perigoso nos seus limites. Busca viver a liberdade e diversidade do Oeste americano, tentando assim o desenvolvimento de uma nova consciência, dentro de uma sociedade que aniquilava o indivíduo. Qualquer escolha que fugisse ao padrão convencional estava marcada como um mdelo marginal.
Nesta experiência e a partir do registro criado, não tem como não identificar questões sociais, políticas, comportamentais e filosóficas.
Ao longo do período onde cruzou o país com um grupo de amigos, diferentemente dos demais, observei que o Sam, fez de forma mais consciente e observadora o que levou a registrar sua experiência.
O meu respeito e admiração a um escritor que em algum momento, sentou e durante três semanas (não é mito!!) registrou sua experiência num rolo de telex, num texto sem vírgulas e pontos. Haja fôlego narrativo. Recomendo "On the Road".

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terça-feira, 14 de agosto de 2012

SE EU FECHAR OS OLHOS AGORA


de Edney Silvestre
Editora: Record 
Resenha em 31 de julho de 2012
Por Maria Virginia de Vasconcellos

Uma narrativa que atrai desde o primeiro capítulo, com diálogos rápidos, roteiro intenso, e que mereceu adjetivos como “eletrizante e envolvente” com toda razão  pois, permanece na nossa mente de forma agarrada até a última página.

A partir do encontro de dois adolescentes com o corpo da morta, assassinada, nunca mais essa imagem se desmancha na sua memória.  A vítima fica encrustada juntamente com as múltiplas interrogações e perguntas que os dois não foram capazes de responder. Nem mesmo com a ajuda do Senhor velho que os poupou da parte mais perversa da história. E ambos os meninos carregaram esta lembrança e as interrogações pela vida afora.

É um romance investigativo que vai além da denúncia do criminoso. Edney Silvestre aproveita para denunciar, como pano de fundo,  os donos do poder econômico, político e social, tratando não só da questão da barra de ouro e da barra da terra, mas especialmente da barra de saia. Sobretudo o poder exercido sobre as mulheres, embora  não deixe de mencionar o poder sobre os mais fracos (lembrando a surra muito bem descrita que o menino Paulo leva do pai), e o descaso aos mais velhos, esses incógnitos, cuja morte nem é percebida.

No cenário, baseado na década de sessenta no Brasil,  prevalece a mentira e a hipocrisia, e os olhos fechados para os bastidores que o velho senhor  e os meninos pretendem desvendar.  A cada capítulo a cortina se abre para mais um espetáculo de violência.

O final contundente é lógico, a meu ver, pois não apresenta um happy end e é coerente com o título do livro.
A mensagem que fica é “Nada neste país é o que parece”.

Conclusão: Recomendaria o livro –  com todas as letras.
Para mim, um dos melhores que lemos no Grupo de Leitura.
Em 2010 recebeu os prêmios S.Paulo de Literatura (categoria estreante) e o Prêmio Jubuti – melhor romance.
Polêmica sobre o Prêmio Jabuti:Se Eu Fechar os Olhos Agora, editado pela Record, recebeu o Prêmio Jabuti de melhor romance em 2010, sendo que Leite Derramado, de Chico Buarque, editado pela Companhia das Letras, foi o segundo colocado na categoria. Os três primeiros colocados de cada categoria concorriam ao mesmo prêmio como Livro do Ano e nessa escolha Leite Derramado foi o vencedor. Na primeira fase, a escolha era feita por especialistas, enquanto na segunda havia uma quantidade maior de votantes e muitos empresários do setor. A premiação de Leite Derramado gerou, assim, muitos protestos, inclusive uma petição on line intitulada "Chico, devolve o Jabuti!". A editora Record anunciou que deixaria de participar da premiação, alegando que na escolha de Livro do Ano personagens midiáticas tendem a ser favorecidas e possivelmente muitos votantes nem tenham lido os livros, além do que o regulamento seria desrespeitoso com os autores e com o júri especializado.[4]
Após a polêmica, a Câmara Brasileira do Livro anunciou mudanças na edição do prêmio para 2011, passando a concorrer ao prêmio de Livro do Ano apenas os vencedores de cada categoria.[5]


quinta-feira, 12 de julho de 2012

MONSIEUR PAIN


de Roberto Bolaño
Editora: Companhia das Letras

em 25 de junho de 2012
Por Maria Virginia de Vasconcellos

O que dizer do Monsieur Pein? Um tipo maçante, a meu ver. Embora bem caracterizado.
Mas, todo o livro me pareceu enfadonho tanto no estilo como no conteúdo.
( Perdoem os que gostarem; mas verdade é que algo fascinante para alguém pode ser o máximo de tédio para outro leitor).

O personagem me fez lembrar a canção de Geraldo Azevedo chamada “Na primeira manhã que te perdi”: o Monsieur Pein se assemelha a um “conde falando aos passarinhos, a um bumba meu boi sem capitão, desatinado – cruzando ruas, estradas e caminhos, como um carro correndo em contramão, como um boi perdido na multidão.
Como um caco gemendo no porão. Lamento noturno dos viúvos. Solidão.”

Apresenta uma solidão sem fim, um comportamento obsessivo e sem rumo.

A música nordestina é linda e me comoveu desde a primeira vez que ouvi.
Diferentemente, não me identifiquei com o personagem destaque do livro.

Além disso, os detalhes me foram cansativos, os relatos longos e inócuos – melhor dizendo, sem sabor e sem cor.

A narrativa, dita policialesca, foi se arrastando sem surpresas e,  a meu ver, chegou a lugar nenhum.
Qual a mensagem do livro? Divulgação do mesmerismo? Não parece.  Pergunta central? Fico pobre de respostas, sem asas na imaginação e sem interpretações que me enriqueçam.
Para mim, a estória foi tão aborrecida que nem percebi qualidades.
De fato, já nem me lembro do que li e o que li nem me suscitou comentários entusiáticos ou conversas com amigos.

Conclusão: não recomendaria o livro – Não recomendaria - com todas as letras. Sem concessão.
NÃO RECOMENDADO. PONTO FINAL.


quarta-feira, 11 de julho de 2012

Monsieur Pain

de Roberto Bolaño

por Beth Eloy

Fui tomada por sentimentos ambíguos durante a leitura do livro Monsieur Pain, de Roberto Bolãno. Apreciei a técnica narrativa nos transportando a uma rede de mistérios, nos quais sonhos, cenas de filme e caminhos labirínticos ocupam o mesmo espaço. Me senti confusa com essa profusão de mistérios que forma inseridos na tama, mesclando fatos reais e outros ficcionais.
A narrativa, mesmo precisa, talvez aí resida uma grande capacidade do autor, se perdeu num labirinto ocultista e investigativo, onde personagens vão sendo introduzidos na trama sem que fique claro o que é sonho, conspiração, perseguição ou psicose.    

1 - O personagem

O narrador e personagem principal, Pierre Pain, é um pacato e inofensivo francês, temeroso, fraco, enfrentando forças obscuras e potências que ficam muito além do seu entendimento.
Salta entre pensamentos filosóficos, terrores noturnos, sonhos, premonições sempre acompanhado de personagens que aparecem e somem da trama e de outros que aparecem fruto da fantasia e solidão do personagem que o apoiam  no difuso mistério que envolve médicos, hospital, mundo esotéico, guerra e conspirações políticas.
Tudo no romance é ambíguo e suspeito: o filme, o galpão escuro, uma casa de shows, sonhos, premonições, o suicídio de Terzeff, o suborno, os espanhóis subordinadores, Vallejo, Plemeur-Bodou, figuras históricas e de existência comprovada como Pierre Curie e Irene Curie. Todas essa figuras se cruzam num itinerário criativo do autor na sua narrativa.
Nessa busca por pistas que clareassem a minha procura para tantos entendimentos e conjunções do mundo real com o imaginário eu já era uma leitora sacrificada indo para pesquisas no google para tentar respostas que dessem consistência ao meu entendimento.
Apesar da estrutura pesada do livro, dos personagens, da trama entremeada de suspense, investigação, perseguição e sonho achei a redação clara.
Não recomendaria Monsieur Pain como livro de porta de entrada de Roberto Bolãno. Talvez conhecendo mais da sua obra possa entende o sentido da literatura fantástica que me foi apresentado nesse livro.


 

terça-feira, 12 de junho de 2012

O BEST SELLER



de Olivia Goldsmith
Editora: Record, 1996 
(Tradução Alves Calado)
 por Virginia de Vasconcellos em junho de 2012
Trata-se de cinco histórias de autores de livros que num mesmo outono disputam presença na lista dos mais vendidos.  Cada história tem seu personagem principal e uma contrapartida no jogo de cena:
i)                     Camilla Clapfish (Livro: Uma semana em Florença) + Frederick
ii)                   Judith  (Livro: Em plena consciência) + Daniel que roubou a Judith- tornando-se Jude Daniel.
iii)                  Susan Baker Edmonds (…) + Edith + Alf
iv)                  Terry o`Neal (Livro: A duplicidade dos homens) + Opal + Roberta (dona da livraria)
v)                   Geraldo Och Davis (GOD) (…) + seu pai.
Pode-se acrescentar uma sexta história, a da editora Pam Mantiss, que para ganhar dinheiro planeja um livro ghost do autor morto + sua contrapartida, o escritor Stewart, o ghost do ghost,  autor contratado,  que fica revoltado após a publicação de ‘seu’ livro com nome de outro.
O universo editorial é descortinado sem pudor e apresenta-se tanto o lado bom e honesto como o feio e ruim.
Outros personagens (Craig, Emma e Alex - editores e agenciadores) são todos fortes e bem caracterizados, mas divididos de forma bem maniqueísta entre aqueles do bem (os inocentes, inseguros) e os do mal (personalidades sórdidas), sem meio termo. O eterno dilema dual entre o bem e o mal continua sendo atrativo.
Os cenários são bem descritos, com detalhes extremosos sobre os quartos de hotéis, paisagens, varandas, móveis, roupas e ambiente em geral.
A trama e o senso de humor prendem o leitor durante um longo tempo até o momento em que a autora parece se cansar de seus personagens e finaliza de forma abrupta a narrativa: literalmente `sumindo` com a Pam, matando GOD e juntando num mesmo grupo os bonzinhos. Neste ponto, os “merecedores” de felicidade se entrelaçam em casos amorosos.   Não aqueles merecedores da presença nas listas de mais vendidos – listas estas sujeitas a todo tipo de manipulação - mas aqueles que são destituídos de maldade.
Ao final, uma decepção: happy end absoluto porque todos os personagens malignos são castigados impiedosamente, enquanto aqueles confiáveis e bonzinhos são beneficiados com sucesso e alegria.
Na página 400 deste livro há uma citação interessante: “Há uma diferença enorme entre ser um critico ou um resenhista. O resenhista reage à experiência do livro” (Cristopher Lehman-Haupt). Pois nesse sentido, estes meus comentários são próprios de um Resenhista e jamais de um crítico. Minhas reações como comentarista foram de simpatia pelo livro que a meu ver é muito recomendado
Vale acrescentar um comentário sobre o filme israelense “AVIVA, meu amor”, vitorioso de vários prêmios na Polônia e em outros países. Com a mesma força, esse filme apresenta o tema relacionado à história de Jude & Daniel e Pam & Stewart, da nossa autora Goldsmith:  AVIVA, o personagem destaque do filme, é também autora, de contos que são hipocritamente roubados por um antigo e notório escritor-Professor que se encontra sem inspiração para novos livros. Ela vende os contos por necessidade desesperadora de dinheiro e quando são publicados com nome do Professor, toda a sua família descobre e faz com que ela desperte seu sonho e tenha arrependimento pelo seu ato. Ela sabe que já é tarde, pois assinou contrato cedendo ao Professor seus escritos, mas vai pedir o resto ainda não publicado  mesmo considerando que estes nunca deverão ser reconhecidos por editoras.
A presença desta temática, tanto na literatura como no cinema, nos leva a acreditar numa realidade hipócrita no mundo editorial. Esse cenário de escritores iniciantes mostra um calvário com caminhos espinhosos; e a obtenção de publicação pode ocorrer muito mais pelo valor comercial, pela sorte e/ou por meio de relacionamento -  do que por um verdadeiro talento. (assim como acontece algumas vezes em outras áreas profissionais) .
     RESENHA-BESTSELLER.22maio2012.doc