terça-feira, 11 de abril de 2017

CONTAR TUDO

de Jeremias Gamboa


por Cristiane Vianna Rauen


Contar tudo é um livro sobre o penoso processo criativo de um jovem escritor da periferia de Lima. Nas 531 páginas de sua redação muito bem escrita, Gabriel Lisboa nos conta toda a trajetória que percorreu durante dez anos de sua vida para finalmente escrever o seu primeiro romance.
A narrativa se inicia no verão de 1995 quando o tio de Gabriel, Emilio, também seu pai adotivo, consegue uma entrevista de emprego num periódico oposicionista de nome Proceso. Impressionado pelo fato de Gabriel estudar numa das universidades mais prestigiadas de Lima e ter uma bolsa integral por desempenho acadêmico, Francisco De Rivera concede ao rapaz o emprego. De Rivera é apresentado, então, ao leitor como a primeira influência ao jovem escritor, assim como seu colega de trabalho e mentor, Saúl Vegas.
Em sua primeira experiência de trabalho, na Proceso, Gabriel se especializa e passa a alcançar cada vez mais destaque como jovem jornalista. O ofício lhe permite aprimorar sua capacidade de redação, lhe traz prestígio e ascensão. No entanto, Gabriel sente que ainda precisa escrever.
É nesse momento, na universidade, que conhece sua maior influência no processo criativo, Santiago Monteiro, o seu amigo poeta. Monteiro o convida a participar das aulas no curso de Oficina de Poesia. A partir de então um novo mundo abre-se diante de Gabriel e muitas novas influências surgem em sua vida, como Jorge Ramírez Zavala, também poeta, e Bruno Lorente, o Spanton.
Nas férias de verão seguintes, já cansado do ritmo e da falta de pagamento de salários da Proceso, Gabriel consegue emprego no periódico La Industria, para onde também tinha sido transferido De Rivera. Gabriel passa por algumas seções do La Industria até alcançar o cargo de redator da revista de seu maior interesse, a Semana, cujo editor era o próprio De Rivera. Na Semana, Gabriel atinge destaque e projeção com suas matérias até o momento em que é convidado a assumir o posto de editor do periódico.
Esse poderia ser o início de uma promissora carreira jornalística para nosso protagonista, no entanto, é nesse momento que o romance tem sua reviravolta. Gabriel torna-se um excelente editor da Semana, administra uma grande equipe, executa fechamentos irretocáveis, porém sente-se completamente frustrado e perdido.
Inicia-se o período negro da vida de Gabriel, que envolve-se cada vez mais com bebidas, drogas, noites mal dormidas e uma insatisfação e ausência de sentido em seu trabalho.  Quando o caminho parecia não ter mais volta, Gabriel se atém ao seu maior desejo, escrever, e decide demitir-se na edição da Semana para se dedicar integralmente à redação de seu livro.
Sem emprego, vivendo apenas das economias que seus trabalhos anteriores haviam lhe proporcionado, Gabriel enfrenta novamente o bloqueio criativo que o angustia durante toda a narrativa. A necessidade o obriga a dar aulas no curso de Expressão Escrita na faculdade, convite feito pelo editor dos livros de seus amigos Monteiro e Zavala, Jaime Estrada.
É nesse curso que Gabriel conhece Fernanda, a primeira pessoa que Gabriel sente amar realmente e que o influencia das mais diversas formas, transformando definitivamente sua vida.
 A história de Gabriel mostra que o processo de produção da escrita é difícil, inconstante, insólito - apesar de ancorado em influências diversas, e muito particular. Enquanto seus amigos já produziam materiais publicáveis, o jovem permanecia paralisado, inerte, preso a traumas perturbadores detalhadamente descritos na obra. Até que, finalmente, sem razão certa, ou motivo aparece, consegue desabafar de uma só vez e nos contar tudo.
Um livro extenso, de fácil compreensão e leitura, que prende a atenção do leitor e nos faz imaginar, em diferentes momentos, que o excesso de “verdade” e de detalhes nos relatos do narrador pode se dever, em certa medida, a uma autobiografia disfarçada.
Minha opinião: recomendo.


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