de Yasunari Kawabata
Comentários de Guido Azevedo
O País
das Neves é uma leitura que não exige paciência de monge ou sensibilidade de
poeta, mesmo sem elas, o leitor vai se deliciar com um mergulho na emoção do
feminino. Não nego que seriam características interessantes para uma análise
mais profunda da obra, daí essa minha análise, tão superficial.
Deu para
perceber o vão esforço de Kawabata, em
compreender e explicar o comportamento e as emoções do feminino através da
relação de Shimamura, um alter ego do escritor, no livro, “bon vivant” e pesquisador
das tradições japonesas que busca se aprofundar na compreensão do comportamento
de Komako uma gueixa real, que o encantou por algum tempo e o fez retornar repetidas
vezes a uma região do Japão, caracterizada como o País das Neves.
Shimamura
é especialista na cultura japonesa antiga, teatro, música, trajes e costumes, o
que dá ao autor, espaço para explicar tópicos das tradições japonesas do
alimento aos trajes, das canções à fabricação de tecidos como ceda e linho da
neve, numa riqueza de detalhes que glorifica a sua origem e qualifica a
complexidade das relações e tradições nipônicas.
A essência
do livro, no entanto, é o mergulho nas relações humanas, nas sutilezas da vida
de gueixa, nas facilidades e restrições que lhe são impostas pela profissão
que, em nada se parece com as profissionais do sexo ocidental.
Assim,
acessamos o País das Neves por um longo túnel, na sequência das viagens de
Shimamura para encontrar Komako e tentar compreender seus sentimentos,
literalmente lembrados pelo seu dedo indicador esquerdo, como um testemunho de
suas andanças pelas mais sensíveis e profundas regiões dessa terra fria.
Comovente
é a capacidade do autor de integrar as descrições do ambiente, do clima e das
paisagens com clarezas de neve nova e escuros de noites sombrias, concatenando
essas imagens com as emoções dos personagens, em cada ação o ambiente, o clima,
o lugar sintonizam com as pessoas, as tradições ou as emoções e refletem
tonalidades semelhantes.
“Talvez
pelo raiar do sol, o brilho da neve no espelho era mais intenso, como se ela
queimasse gelada. Acompanhando esse movimento, o cabelo da mulher que sobressaía
no reflexo da neve também intensificou o preto, que brilhava lilás.”
A
natureza, as montanhas e a neve se integram as emoções, aos sentimentos dos
personagens para a construção das cenas em uma dança sutil que rivaliza em
beleza e contrastes com o jogo de sedução e recusa, negação e entrega de
Komako.
A
natureza e o desejo se equivalem, se complementam se ajudam: “Shimamura ...
descobriu que tendia a perde naturalmente a seriedade, por isso caminhava
sozinho pelas montanhas, achando que era o lugar ideal para recuperá-la.
Naquela noite havida descido para essas termas e solicitado uma gueixa, depois
de passar sete dias pelas montanhas fronteiriças.” Quando conheceu Komako “Shimamura chegou a
duvidar de seus olhos, achando aquilo era efeito do início do verão nas
montanhas, que o enganava”.
A inglória
tentativa de entender o comportamento feminino e buscar um mínimo de lógica
nessa relação está a todo momento sendo posta à prova. Shimamura pede a Komako que
lhe arranje uma gueixa, porque ele simpatizou com ela e não quer manter
relações que lhe impossibilitem de uma convivência mais familiar no futuro. Demanda
natural e até elogiosa para ele, que é recebida com repulsa, raiva e
incompreensão por Komako.
Desse
ponto em diante se desenvolve a trama do livro, num enredo mais ou menos
previsível, sem grandes alterações numa sequência de invernos com mais ou menos
neve, onde a tradição japonesa de esconder os sentimentos, respeitar o coletivo
e buscar a satisfação individual, encontra a resistência, a incompreensão e o
jogo de sedução até o desenlace esperado. “Desde então, quando passava a noite
com Shimamura, Komako não tentava ir embora antes do amanhecer.”
A
tradição japonesa é introduzida como um dos personagens das cenas construídas
por Kawabata, cada oportunidade é explorada para explicar, apreciar e louvar a
tradição das vestes, dos costumes, dos alimentos, das residências e assim por
diante.
O culto
às gueixas é explorado e explicado de forma respeitosa e seus costumes,
formação, valores e vestes são descritos em todas as oportunidades com
admiração e respeito pelo profissionalismo, competência nas artes da dança, do
canto, da prosa e, finalmente, no relacionamento financeiro explícito entre os
donos das pousadas e os hóspedes, numa contabilidade bem profissional e cronometrada.
Concluindo,
a temática principal e O País das Neves é o esforço vão em busca do
entendimento da mulher, em seu jogo de sedução. Além dos dois personagens
centrais, as paisagens e a tradição japonesa recebem tratamento importante,
enquanto os demais personagens são secundarizados em relação à importância dos
sentimentos e da busca pelo entendimento da complexidade da relação entre o
masculino e o feminino, na tradição japonesa.
Gostei
muito, mas me falta coragem para uma indicação mais geral. Indico
seletivamente.
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