terça-feira, 26 de setembro de 2017

ESAÚ E JACÓ


Autor:     Machado de Assis

Editora:  Nova Fronteira, 2016


Resenha por Maria Virginia de Vasconcellos em setembro de 2017

Para o Grupo Contemporâneo de Leitura


Introdução

Comentar qualquer obra de Machado de Assis exige coragem e humildade. A coragem é pra enfrentar um autor considerado por muitos como o maior escritor brasileiro de todos os tempos. E a humildade é para que o resenhista se coloque no exato papel de amador em literatura. 

Sobretudo quando não se tem pretensão de pesquisa alguma, e menos ainda pesquisa acadêmica. Quanto a essa, há muitos ensaios e teses publicados sobre a obra Machadiana, que aqui, vale dizer, não foram intencionalmente procurados; os poucos mencionados simplesmente, por acaso, “caíram do céu”.

Feita essa observação, podemos nos aventurar na espontaneidade liberal e registrar  impressões e emoções estritamente pessoais suscitadas pela leitura.

  1. Autor([1])


 Joaquim Maria Machado de Assis nasceu em 1839 (21 de junho) no Rio de Janeiro e cruzou o século XIX e veio a falecer em 1908, com 69 anos.

(Por curioso, vale mencionar que neste ano de 1908 nasce o grande Guimarães Rosa)


Com os pais em condições de pobreza, Machado de Assis frequentou apenas a escola primária e trabalhou desde antes dos 18 anos. Dados documentais sobre a meninice do autor são escassos. Porém, sabe-se que embora seus ancestrais fossem pessoas livres (não escravos),  dependeram de “padrinhos”  de classe mais alta para sobreviverem.


Foi aprendiz de tipógrafo na Tipografia Nacional, atuou como revisor de jornal, como jornalista e mais tarde, em 1867, como funcionário público, emprego estável e bem pago.

Ainda em 1867 recebe uma comenda do Imperador D. Pedro II, indicativo de prestígio e consideração e social. 

Casou-se com Carolina Xavier (1868), portuguesa culta, que permaneceu com ele até o fim da vida, e o assistiu em momentos de doença: em torno dos 40 anos surgiu um sério problema na vista e  revelou-se a epilepsia. (alguns comentários apontavam certa gagueira).


Interessante notar que apesar de demonstrar cosmopolitismo e conhecimento de literatura universal, Machado era um sujeito pouco viajado, nunca tendo saído para o exterior: seus deslocamentos se reduziram a Petrópolis, Vassouras (RJ) e Barbacena (MG). ([2])

E ademais, mesmo utilizando o contexto histórico nos seus escritos, sabe-se que não se misturou aos arroubos políticos e nacionalistas do século. Adotou um distanciamento, uma visão irônica, crítica e cética, especialmente nos seus anos de maturidade.


Apesar da força e da ousadia como escritor, Machado de Assiste, paradoxalmente, manteve  equilíbrio tanto amoroso como profissional no decorrer de sua vida - aparentemente serena. Como escritor, foi amplamente reconhecido no mundo intelectual desde as primeiras publicações.

b. Contexto da obra ( [3])


Machado de Assis escreveu ESAU E JACÓ na maturidade. O livro foi publicado em 1904, quando o autor tinha 65 anos, após, portanto, de já’ identificado e louvado por sua vasta obra. Vale a pena mencionar que, neste mesmo ano de 1904, faleceu sua esposa, que com ele vivera durante 35 anos.


Cabe assinalar, como lembrete, algumas curiosidades dessa década tão distante:

- Dois anos antes, em 1902, foi publicado os Sertões de Euclides da Cunha.


- No Rio, ocorria a Revolta da Vacina e uma grande reforma urbana, executada pelo Prefeito Pereira Passos. E, ademais,  o início da gravação de discos no Brasil.


- E no mundo morria, com 47 anos, o contista e dramaturgo russo Anton Tchekov.


Outros elementos da história do século XIX no Brasil  merecem citação para compreender o mundo de Machado de Assis:


Em 1822 – temos a Independência do Brasil;

em 1840 - começos da fotografia, em 1843 – primeira linha regular de navios entre Rio e França;

em 1850 – extinção do tráfico de escravos; e introdução do piano nas casas da elite cariocas e brasileira, em 1854 – começo da iluminação a gás,  do carnaval, dos entrudos cariocas;

em 1865 – guerra do Brasil, Argentina e Uruguai contra o Paraguai;


em 1868 – instalação de linhas de bonde sobre trilhos; (Aqui vale lembrar que as carruagens eram o meio de transporte dominante no século XIX e os personagens do livro ESAU e JACO andam em “Cupês – carruagem fechada de duas portas e geralmente de 2 lugares puxada por 2 cavalos, Librés  ou   Vitória – carro macio e leve com capota móvel, sendo mais elegantes os pretos sem decoração”. (Ver nota de roda pé 3);


Em 1871 – publica-se a Lei do Ventre Livre.


Até aqui, Machado fora poeta, cronista, jornalista e ensaísta.

Seu primeiro romance Ressureição foi de 1872.


Na década de 70 em diante, surgem os telefones, Chiquinha Gonzaga na música  e, em 1879  inaugura-se a rede de iluminação elétrica.

E Machado não para de publicar seus romances, e para mencionar alguns mais conhecidos temos A mão e a Luva, Helena, Iaiá Garcia, Memórias Póstumas de Brás Cubas.


Em 1888 – a Lei Áurea anuncia o fim da escravidão e, finalmente, em 1889 – temos a Proclamação da República – que é pano de fundo para o romance ESAÚ e JACÓ.


Buscando consonância entre as leituras feitas pelo grupo, cabe lembrar que, por coincidência, nosso último livro, O Jantar Secreto, de Monthes, é contemporâneo por excelência, ambientado no século XXI, seja na linguagem, no uso da tecnologia, nos personagens. É, pois, interessante fazer um contraponto, um espelhamento, entre o mundo machadiano do século XIX e o contexto da antropofagia apresentado por Monthes, e ponderar sobre a distância gritante entre esses universos.


No entremeio desses dois tempos, o século XX nos trouxe as guerras mundiais, extraordinário avanço em conhecimento, invenções e tecnologias revertidas em transportes, comunicações, modificando esse panorama que circundou a vida de Machado. Até chegarmos ao século XXI.


Mesmo sem levantar em profundidade os eventos sobre as mudanças externas e internas da sociedade brasileira, pois não estamos construindo um ensaio, nem queremos cansar o leitor, vale a pena registrar essa observação para notar as fortes e sutis influências desses diferentes contextos nas narrativas de Machado e de Monthes.

c. A Narrativa / O que nos conta a história?

O romance ESAÚ e JACÖ trata da vida dos gêmeos Pedro e Paulo que, embora idênticos na aparência, desde a infância, são opostos quanto à personalidade, temperamento e visão política. São filhos de família abastada, cujo pai, Santos, é profissional da área de bancos e a mãe,  Natividade uma senhora de beleza reconhecida.

Pedro torna-se médico e um monarquista conservador, enquanto Paulo estuda Direito e adota as ideias liberais republicanas.

Para esquentar ainda mais a rivalidade entre os dois, eis que se apaixonam pela mesma moça, Flora, que gosta de ambos e não consegue decidir qual escolher como namorado.

Com este triângulo amoroso diferente, desenvolve-se a história cujo final não será aqui revelado para surpresa e deleite dos próximos leitores.

Essa contenda entre irmãos evoca algumas figuras bíblicas como Caim e Abel, os próprios Esaú e Jacó que dão o título ao livro, e não se pode esquecer que o Pedro, criador da Igreja Cristã, tinha desavenças e rivalidades com o apóstolo Paulo, fato  esclarecido no livro Zelota, lido pelo grupo em 2015 ([4]).  Lembramos ainda que o autor português Manuel Sousa Tavares se valeu dessa rivalidade fraterna para construir o livro Rio das Flores ( [5]) - lido pelo grupo em 2012/13 –  até hoje lembrado; aí também os irmãos tinham posição política contrária.

Embora essas referências sobre irmãos na Bíblia e na literatura não sejam inusitadas, o Estilo e os Personagens construídos por Machado de Assis tem tudo de especial.
d. Estilo e construção de personagens

O romance parece um agrupamento de pequenas crônicas, escritas pelo autor com prazer e gosto, e perfeitamente encaixadas na trama principal. Essa técnica de montagem proporciona a delícia de se abrir qualquer página do livro e ler qualquer capítulo – e, imagine,  são mais de cem -  com sabor de estar lendo uma crônica.


O autor, utiliza expressões de época cheias de significados – tais como – “Trazia o calo do ofício” (Pag. 41) para explicar a visão profissional -  ou – “As senhoras Viram passarinho verde” para dizer que estavam muito contentes (pag. 21). Muitos desses ditos entraram para o século XX afora e eram usados por nossos avós.


Segundo literatos, na segunda fase das publicações de Machado de Assis, é comum a digressão , ou seja, o afastamento do roteiro da narrativa para introduzir “um comentário, uma anedota, uma teoria, uma reflexão sobre o andamento da história”.(Sanseverino[6])


São vários os capítulos em ESAU e JACÖ  que o autor conversa com o leitor, ora para explicar brevemente ações dos personagens, ora para acalmar o leitor ou leitora, tratando-a de “querida” e quase trocando ideias, ou mesmo para esclarecer porque,  na narrativa, foi tomado esse e não aquele caminho.  Além de parágrafos inteiros entremeados no texto original (vide pag. 28):  “LEITOR, não é muito que percebas a causa daquela expressão....”.


Como exemplo, ver (na pag 43) a descrição do diplomata aposentado, Conselheiro Aires, protagonista importante na história, que tudo acompanha e analisa : “Era cordato, repito, embora esta palavra não exprima o que quero dizer”.  Ele coloca as palavras, mas, tem dúvida se estão completas no seu significado e discute com o leitor, nos introduzindo na narrativa.


Não descreve com detalhes nem ambientes e nem as roupas, talvez porque, utilizando suas palavras, “Explicações comem tempo e papel, demoram a ação e acabam por enfadar”. Contudo, constrói o psiquê de seus personagens sem pressa, detidamente, brincando com os adjetivos e as palavras.


Afinal, Machado é antes de tudo um afiado e perspicaz analista dos sentimentos e da alma humana, um especialista em vasculhar o interior dos pensamentos. É um craque na construção do psiquê de cada personagem, mesmo aqueles  que não tem papel de destaque na história. Segundo ele “O Coração é o abismo dos abismos”.


Essa qualidade faz dele um escritor atemporal e universal, motivo de tradução de sua obra em vários idiomas.

e. Mensagem


Difícil extrair uma mensagem principal desse livro de Machado. Não faz apologia de atitudes políticas nem religiosas.  Parece um aviso ou um alerta, ou uma lição sobre as cavernas labirínticas da alma humana.

Recomendação: como exige leitura lenta, não recomendo para jovens, tampouco para quem não tem gosto pela literatura em si.


RESENHA – ESAÚ E JACO – set2017.doc



[1] Os dados biográficos aqui citados tem como fonte Pequena Biografia de Machado de Assis -  Luis Augusto Fischer in Memórias Póstumas de Brás Cubas da Editora LPM – e  in ESAU E JACO’ da Editora Nova Fronteira
[2] Atentar semelhança com Johan Sebastian Bach, gênio da música, que jamais saiu de sua cidade natal.
[3] Cronologia : Vida e Obra de Machado de Assis, por Luis Augusto Fisher  in Memórias Póstumas de Brás Cubas pela editora LPM
[4] Zelota, Reza Aslan
[5] O Rio das Flores – Manoel Sousa Tavares
[6] Antonio Sanseverino – professor de Literatura Brasileira da UFRGS e autor da tese “Realismo e alegoria em Machado de Assis” em a Voz do Morto:  ver em As Memórias Póstumas  de Brás Cubas – editora LPM POCKET

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Esaú e Jacó

    de Machado de Assis

por Carlos Guido Azevedo

Cresci lendo e admirando a literatura estrangeira, acho que eram os romances mais bonitos e mais acessíveis da estante da biblioteca vizinha à minha casa. Quando alcancei a estante de literatura brasileira, conheci José de Alencar, não digeri, não compreendi e voltei para as estantes mais baixas, onde moravam Gorki, Dostoievsky, Leon Tolstoi, Flaubert, Balzac e afins.
Só voltei a ler autores brasileiros no vestibular, de certa forma através de Jorge Amado, Érico Veríssimo, e outros. Então Machado foi uma descoberta muito tardia. Não precisei ler muito para perceber que estava diante de um gênio, sua categoria ultrapassa a média de escritores brasileiros e constitui mesmo uma matriz que orientou e alicerçou seu desenvolvimento. Admiro Machado de Assis, incondicionalmente, como aquele que me ensinou a valorizar a literatura brasileira.
No meu entender, apesar de sua imensa erudição ele escreve como se fosse uma crônica jornalista, pela leveza e objetividade de seus textos, por mais simples que sejam estes, sempre trazem uma mensagem edificante.
Assim, em que pese a importância do momento que o Brasil estava vivendo na época da proclamação da república, ele conta em Esaú e Jacó, através da vida de algumas famílias, os eventos da época, como numa novela atual, em particular a do casal Santos e Natividade que geraram dois filhos gêmeos que brigam sem motivo aparente, desde o útero até a vida adulta na política.
O livro Esaú e Jacó fala como desenvoltura do sentimento de indiferença dos brasileiros, com os destinos da pátria. A ausência do povo nas grandes decisões, a dificuldade em compreender como aconteceu a proclamação da república e a indiferença com suas consequências.
Mais ainda, disseca o sentimento de egoísmo e de interesses pessoais que sedimentam as grandes decisões da pátria.  Descreve nossa natureza dúbia e indiferente aos destinos grupais, além dos pessoais e familiares. A ascensão social é vista como determinante em todos as ações privadas e públicas e a flexibilidade entre classes é mostrada como fruto do sucesso econômico ou político, como demonstram todos os seus personagens.
Nenhuma iniciativa em qualquer dos seus personagens excede os círculos de interesses pessoais, familiares e de negócios: do “irmão das almas”, de pedinte a empresário, fruto do roubo de uma esmola generosa. “Quando a sorte ri, toda a natureza ri também, e o coração ri como tudo o mais”; ao Santos, o pai dos gémeos que “ nasceu pobre e por ocasião da febre das ações (1855), dizem que revelou grandes qualidades para ganhar dinheiro depressa. Ganhou logo muito, e fê-lo perder a outros. ”  Ou como o Custódio o dono da Confeitaria Império, querendo mudar a tabuleta no dia da proclamação da república para não perder cliente. Ou o cargo assumido por Batista o pai de Flora a namorada dos dois gêmeos que nunca se decidia por nenhum e cuja dubiedade a levou à morte, quando se maldizia porque a comissão do pai iria lhe tirar da convivência dos gêmeos: “ Não diga isso, Flora; é comissão de confiança para fins nobremente políticos. Creio que sim, mas daí a saber o objeto especial e real, ia largo espaço. ”
Afinal, o livro tem o Brasil, seu povo e sua alma, como tema. Uma eterna briga de irmãos, sem causa e sem origem, sem ideal ou ideologia, num esforço rasteiro de buscar vantagens na própria briga em si. “De noite, na alcova, cada um deles concluiu para si que devia os obséquios daquela tarde, o doce, os beijos e o carro, à briga que tiveram, e que outra briga podia render tanto ou mais. ” 
Como as coisas pessoais, os assuntos da pátria são tratados em função das vantagens que podem advir para quem toma as decisões ou da necessidade primeira de não desagradar nenhum lado da questão, como o conselheiro Aires.
Afinal, da independência à república, das eleições aos golpes de estado, dos impeachments aos processos presidenciais, das propostas de PEC às propostas de lei, praticamente tudo nesse país rende dividendos, mensalinhos, mensalões, bolsa família, bolsa empresário, um país que se acostumou desde a sua origem a administrar vantagens para todas as classes.   
Esse traço da personalidade da pátria, verdadeira falha de caráter, está na origem da pátria, não por culpa dos colonizadores, mas por nossas características como povo que só briga por vantagens, de preferência pessoais ou familiares, raramente de grupo e menos ainda por ideias ou ideais.
Traço cruel de personalidade, ansiosa por não desagradar a nenhum lado, indiferente como as próprias opiniões, tão bem caracterizada no diplomata, pacífico de um lado, cruel, porque indiferente até a si mesmo, de outro.
Assim, acaba a história de Machado, sem suspense, que nos deixa a esperar uma briga, uma tragédia, um ódio fervente, uma postura sanguinária como manda a tradição secular de ódio entre irmãos, que os orientais dizem ser o pior inimigo de todo homem, aquele que poderia ter sido você e cujo ódio supera fronteiras e ideias a ponto de caracterizarem a suprema inimizade. “São inimigos?  perguntou o transeunte árabe, ao ver dois homens se digladiarem até a morte. Não, respondeu o observador, não são inimigos, são irmãos”.
Aqui, no brasil, não haverá isso, a menos que a polícia chegue, que seja preto e pobre, que seja briga por herança, por vantagem, por tráfico ou por ciúme. No mais, será resolvido com troca de favores e vantagens, conta Machado.

domingo, 24 de setembro de 2017

Esaú e Jacó


de Machado de Assis

                                                                     Considerações de Marília Klotz

            Não há como não gostar de Machado de Assis. Obviamente que recomendo o livro.
            Por força do hábito da associação livre a leitura dessa obra me lembrou dois aspectos:
1-     Esaú e Jacó, Cosme e Damião, Pedro e Paulo , Caim e Abel entre outros me recordaram os “pares de opostos” que é um conceito Freudiano. Na psicanálise, Freud nos fala da importância dos pares de opostos para o desenvolvimento humano, tanto assim que considera como uma das mais importantes fases do desenvolvimento infantil, no seu aspecto positivo para a constituição de uma mente mais flexível às mudanças e adaptações da realidade.  O conceito de inteligência , por exemplo, mudou do QI – coeficiente de inteligência medido por índices de conhecimento para a capacidade dos sujeitos de se adaptarem as diferentes situações. Os pares de opostos observados por Freud contribuíram para essa mudança.
No livro, a mãe (Natividade) tem grande preocupação com as diferenças entre os filhos, demonstrando dificuldades com a aceitação das mesmas. Ela associa as diferenças a uma rivalidade de aspecto negativo.  Seu empenho é eliminar ou minimizar as mesmas.  As idéias , as escolhas, as percepções dos filhos são vistas como divergentes e nada tranquilizantes. Hoje em dia, mais do que nunca estamos defrontados com as dificuldades de lidar com as diferenças, com o novo, com o desconhecido seja no plano das idéias, da sexualidade de gênero, na religião, na política etc. Nesse aspecto creio ser melhor lidar com as rivalidades, com os contrastes, com as diferenças a favor do crescimento pessoal e do conhecimento humano do que com uma tranquilidade burra.

2-     Outra associação ao livro foi a da “profecia auto realizável”.  Na economia tem um princípio que é o seguinte: Cria-se um boato que tal instituição bancária vai falir. Todos os acionistas vão lá e retiram seu capital. Por sua vez o Banco acaba falindo mesmo.  No livro quem cria esse boato é a Cabocla, dizendo que os filhos-gêmeos já brigavam na barriga da mãe. Daí para frente toda a preocupação da mãe (Natividade) recaí sobre esse fato. Entretanto, sabemos que tudo aquilo que está no inconsciente presentificado e desejado é motor das ações e comportamentos conscientes.  Inconscientemente a mãe preocupava-se e transmitia isso aos filhos que como efeito responderam sintomaticamente a essa preocupação materna instituindo e mantendo as divergências e as diferenças inevitáveis. Tudo aquilo que é marcado com muita intensidade fica acentuado.  Por exemplo, se numa pessoa gaga você marca sempre a gagueira a pessoa ficará mais gaga ainda. No caso do livro, se você marca sempre as rivalidades entre Pedro e Paulo é isso o que vai se acentuar. Metaforicamente “Flora”, o grande amor dos irmãos gêmeos, para mim simbolizava o reconhecimento dessas diferenças, do jeito particular do ser de cada um, como também um respeito amoroso a este fato, cuja escolha era impossível. Escolher um deles era ficar com a metade do todo! Natividade , simbolizava o ideal, igualmente inatingível e por isso causador de tanta angústia.

Machado de Assis sempre trás de forma poética as mazelas humanas, por conta disso  sua obra, traduzida em tantas línguas, possui a repercussão e o efeito que tem. Ele dialoga com o leitor, antecipa os pensamentos, justifica, enfim interage, fazendo com que as pessoas participem de sua obra.  Muito bom !  Vamos reler os clássicos ?