de Mia Couto
O que é o realismo
maravilhoso?
No início do século
XX, surgiu, na Alemanha, um novo termo que visava designar a nova
tendência pictural do período entre as duas Grandes Guerras, o
realismo mágico.
Após
devastação causada pela Primeira Guerra Mundial, os artistas deste
país tentaram, através da pintura, manifestar-se contra a
degradação e a miséria em que o país se encontrava. Esta
tendência expandiu-se ao resto da Europa, e em alguns países,
passou do domínio da pintura para o domínio literário.
Este
termo foi posteriormente adaptado à realidade latino-americana,
surgindo nas décadas de 30 e 40, um outro termo designado real
maravilhoso.
Autores
como Gabriel Garcia Marques e Isabel Allende, são qualificados como
sendo mágico realistas, colaborando assim, com a presença do
realismo mágico na América Latina.
Um
dos temas predominantes do real maravilhoso é a afirmação cultural
e identidária do continente. Neste sentido, este caráter
reivindicativo e cultural, que visava a afirmação da identidade
latino-americana, tornou-se não só um meio de distinção face às
culturas mundiais, mas também num exemplo a ser seguido por outras
culturas com a mesma ambição.
Tal
como o continente latino-americano, também o continente africano é
marcado pelo exotismo da sua cultura, pelo respeito da tradição aos
antepassados e pela forte presença religiosa do cotidiano. Todos
esses elementos estão presentes na produção literária africana de
expressão portuguesa. Nesse contexto encontra-se Mia Couto.
Através
da sua obra, este autor vem contribuindo, grandemente, para a busca
da identidade de Moçambique, refletindo sobre a influência da
cultura portuguêsa durante a ocupação dos colonizadores e o mísero
estado em que o país ficou após a guerra colonial e a guerra
interna que devastaram Moçambique.
1
– Qual o tema do livro?
Conta
a história de personagens como Tuahir, Muidinga e Kindzu que fogem
das atrocidades da guerra, tentando sobreviver e encontrar um rumo
para as suas vidas. A fuga dos horrores só é possível através da
evasão e do sonho dos personagens.
2
– Qual a premissa central do livro?
Pela
voz do narrador é dado o conhecimento ao leitor da interação entre
dois mundos aparentemente distintos: o mundo real e o mundo
maravilhoso ( o sonho). O narrador relata os efeitos da guerra e da
destruição do país, mas também foca a capacidade dos personagens
de sonhar. E será por essa capacidade de evadir e sonhar que os
personagens sobrevivem ao caos instalado no país e ao estado
letárgico que se encontram.
Neste
contexto, são apresentados dois personagens centrais no livro : um
velho chamado Tuahir e um miúdo a quem o velho chamava de Muidinga.
Pela
voz de Muidinga, surge Kindzu, autor dos cadernos, que narra sua
vida, desde sua infância até o momento da sua morte.
Ao
longo dos capítulos vão sendo narrados acontecimentos do contexto
em que vivem, um cenário de pobreza, degradação e vazio em função
da guerra e do imaginário africano. Essa é a forma que o autor
utilizou para promover a consciência cultural, evidenciando temas da
cultura africana.
É
utilizada uma linguagem poética para fazer a narrativa da estória.
Pelo que pesquisei sobre o Mia Couto essa é uma forma de linguagem
que ele utiliza para contar suas estórias, talvez como recurso para
amenizar o sofrimento causado pelas guerras.
3
– Existe alguma mensagem subjacente?
É
a história do povo moçambicano, suas aventuras, sofrimentos e uma
crítica à guerra civil, a dor e a devastação por ela causada.
Fala de Tuahir: “ Foi o que fez a esta guerra: agora todos estamos
sozinhos, mortos e vivos. Agora já não há mais pais”.
4
- A estória é bem desenvolvida?
A
estória é desenvolvida em dois planos: o primeiro, narra a
história de Tuahir e Muidinga em sua luta diária pela
sobrevivência; o segundo, é a história de Kindzu contada por ele
mesmo em seus cadernos. A partir do momento que Muidinga começa a
ler os cadernos, as narrativas vão se intercalando ( às vezes tive
que voltar para recuperar alguns personagens) até se encontrarem
no final do livro, onde fica explícito que Muidinga pode ser Gaspar,
o filho desaparecido de Farida.
5
– O autor se mantém na trama?
Sim.
Através do uso da prosa com forte base poética. Essa foi uma
característica forte na narrativa do livro.
6
– Capacidade de prender o leitor?
O
autor narrou de forma “mágica” os acontecimentos e experiências
dos personagens e uso de uma linguagem própria e poética. Tive em
algum momento a sensação de estar lendo contos soltos. Ao fechar
cada conto achava que não mais me encontraria com os personagens.
Eis que de repente, eles voltam, e tive que fazer um esforço para me
lembrar do contexto onde estavam inseridos. Exemplo: Surendra, Assani
e Antoninho.
7
– Cria identificação do leitor com os personagens?
Sim.
Mais o que mais gostei foi o uso de provérbios e expressões de
fundo filosófico que me levaram a refletir sobre sonhos, lendas e
feridas. Não é um livro apenas de entretenimento. É um livro de
reflexão, de curiosidades. A narrativa é muito diferente o que pode
fazer com que alguns leitores possam parar no meio da leitura. O
próprio uso do português falado em Moçambique, pode promover
questionamentos do tipo: o que estou lendo. Vale à pena continuar.
“
O que andas a fazer com um caderno, escreves o que? Nem sei pai.
Escrevo conforme vou sonhando. E alguém vai ler isso? Talvez. É bom
assim: ensinar alguém a sonhar” Fala de kindzu
“
O que faz andar a estrada? É o sonho. Enquanto a gente sonhar a
estrada permanecerá viva. É para isso que servem os caminhos, para
nos fazerem parentes do futuro” Fala de Tuhair
“ Esse
é o desafio de desequilibrista – ter um pé em cada um dos mundos:
o do texto e do verbo. Não se trata apenas de visitar o mundo da
oralidade. É preciso deixar-se invadir e dissolver pelo universo das
falas, das lendas, dos provérbios”
- Mia Couto
Concordo com Beth, acho apenas que o autor exagerou na junção e criação de palavras.
ResponderExcluirO livro é poesia que enfatiza a valor do sonho em meio ao cáos:
"É que a vida não gosta de sofrer: a terra anda procurar dentro de cada pessoa. anda juntar os sonhos. Sim, faz conta que ela é uma costureira de sonhos". (Décimo caderno de Kindzu).
Ana Studart