de Hartmud Rosa

Tenho que explicar rapidamente o motivo pelo qual escolhi esse livro. Havia três outros livros de literatura que amei ler esse semestre. Mas esse, que é da socio-filosofia, me causou uma impressão forte, daquela que sentimos quando “entramos” num livro de um jeito e saímos dele diferente.
O que me tocou particularmente na obra de Hartmut Rosa é o fato de se tratar de um autor teórico, e são raras atualmente as teorias sociais que indicam luzes possíveis no mundo, já que estamos sempre sendo informados de inúmeras dinâmicas sociais bastante perversas e práticas marcadas pelo utilitarismo.
Ele desenvolve um pensamento rigoroso como o é exigido a partir do campo dele, mas percebi que ele capaz de acordar no leitor a presença constante do encanto pela vida. Como?
Pela maneira de dar forma ao raciocínio, o seu estilo, lança mão de poema, de compartilhar sensações, emoções, música... E de raiva e tristeza também. A forma e o raciocínio que ele utiliza são condizentes com o que ele quer demostrar. Como um artista que precisa usar cores especificas para que possamos ver o céu do entardecer em Londres do Monet, ele pinta as emoções e assim as vemos, as tocamos. Mas não é por ser belo que há necessariamente encanto, e pode ter encontro e não acontecer nem uma faísca. Não há uma disponibilidade ao encontro por principio, como regra. Há uma faísca...Ou não. Há de se ter um encontro que permita dar vida a emoção. O encontro pode ser com a arte, a espiritualidade, o sentimento para com os outros, com a natureza. É o que ele chama de “Résonnance” e é o titulo do livro, o objeto de sua reflexão. Uma sociologia das relações com o mundo que pode ser compreendida pelo poema de Heine*, que é um exemplo de relações com a natureza.
Pensei no que nos dizia nossa querida professora Eva Leones: Qual é o estatuto do livro? Ele se enquadra em qual tipo de debate contemporâneo?
Hartmut Rosa é filosofo e sociólogo alemão, da Universidade de Jena. Escreveu esse livro em 2018. O primeiro livro que publicou e o tornou conhecido é sobre “Aceleração, uma crônica do tempo”. A sua tese neste livro era sobre a aceleração do tempo e o impacto disso na modernidade tardia.
Nesse ultimo livro que escolhi compartilhar com vocês, cujo o titulo é “Ressonância”, a sua tese é que os homens em todas as dimensões da existência física e espiritual, cognitiva e emocional, desejosos e avaliadores são sempre ligados ao mundo. Sua existência é o vínculo. E esse vínculo se transforma e se desenvolve dentro e a partir da relação com o mundo. Por isso, este livro é um esforço de pensar as relações que estabelecemos atualmente com o mundo. Qual é o tipo de vínculo que estabelecemos? Para responder a essa pergunta, Hartmut investiga a ressonância que é construída pelo vínculo. Seja nas relações que temos com o corpo, seja nas relações que estabelecemos com o meio ambiente, a arte, as religiões, os objetos, etc.
As nossas sociedades atuais devem sempre crescer e inovar. Somos presos a uma escalada, você é constrangido a crescer. É um crescer que não tem metas, nem fim e isso induz uma relação, diz ele, patológica com o mundo. Poderíamos dizer, o mundo é mudo porque somos surdos. Essas relações de indiferenças desencadeiam crises ecológicas, crises democráticas, crises psicológicas (burnout). O que significa uma crise com o ambiente? Isto é, com o não humano isto é com a natureza que tem seus direitos, suas lógicas, ou com as crises das relações com o mundo social (democracias). Por exemplo, quando sabemos dos naufrágios envolvendo imigrantes e ignoramos a situação, é a democracia que está à deriva. Há, igualmente, uma patologia na relação subjetiva consigo próprio no mundo do trabalho, o que antes nos conferiam identidades. Isto é, nossos vínculos nas relações com o mundo se desconectam.
Como não é um livro de auto-ajuda, a chave não é se encantar com o que temos de disponível cada um, mas de refletir sobre as situações sociais e pensar sobre o fato, por exemplo, que o exercício de uma atividade nos alimenta em alegria quando ela porta, em si, o fim que a determina. Por exemplo: porque desenho? Para entrar no mundo das cores, por nada! Poderíamos dizer que nossa vida é boa quando temos um vinculo libidinal que nos liga a ela? Ela, a vida, é o conjunto das pessoas, dos espaços, das tarefas, das ideias, das coisas e dos instrumentos que cruzam nosso caminho.
Para situar o pensamento do autor, poderíamos o colocar no campo da teoria crítica da escola de Frankfurt, na linha de Adorno, Marcuse, Honneth e outros, onde os esforços são de trabalhar sobre a emancipação e questionar formas de alienação.
Lendo o texto, pensei que o termo “ressonância” poderia ser, dar um Sentido às ações, mas decididamente não é isso. O termo representa mais se aproximar de uma faísca que para permitir o fogo precisa de condições e, mesmo assim, mesmo dispondo de todas as condições, pode ser que nada aconteça! Ressonância também não é eco, porque para acontecer o encontro precisa que outra voz se manifeste, não disponível a priori, mas que saibamos escutar. O problema é que nos tornamos uma espécie de “piloto automático” como ter encontro quando o mundo é mudo.
O sentimento de si é sempre o resultado de encontros e de contatos – ou de ressonância ao mesmo tempo físicos e psíquicos e todo desejo humano é um desejo de ressonância, é o que nos lembra o autor mas até a ressonância tem risco de ser instrumentalizada, entretanto ela nos constitui como sujeito. Seria uma nova forma de alienação?
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*O poema de Heine, “O Livro dos Cantos”. (tradução livre)
....“perto do mar, o mar noturno e deserto
Um jovem está em pé
O coração cheio de lágrimas, o espírito cheio de dúvidas
Sombrio e triste, ele interroga as ondas
As ondas cochicham sua eterna canção
As estrelas brilham, indiferentes e frias
E um insano espera uma resposta “....